Sónia Brandão

por Sónia Brandão

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O fado da vida existe.

Devemos acreditar que a nossa vida é regida somente por ele?

Percorremos a vida, para a viver, ou somente vivemos aquilo que se encontra predestinado a nós?

Decidimos mesmo aquilo que vivemos, apesar das circunstâncias que nos são impostas?

Durante anos, acreditei que a vida me iria entregar aquilo que me era destinado, iria vivê-lo da melhor forma e continuar, porque o tempo não para.

A vida é cíclica.

A pior parte é essa. Quando não apreendemos da primeira vez, ela volta a colocar-nos na mesma situação, vezes e vezes sem conta, até nós agirmos de acordo com o que é correto.

Não aprendi da primeira vez. Espero ter aprendido contigo.

Quando te conheci, não pensei nisso.

Achei que eras somente mais uma pessoa a cruzar o meu caminho. Podias, ou não, permanecer, mas tinha alguma esperança de que ficasses.

Apaixonei-me mais pela ideia que criei de ti, mais do que pelo que tu me mostravas.

Principalmente, porque parte das coisas que via em ti, e pelas quais me apaixonei, consegui descobri-las apesar da tua constante vontade de as esconder.

Quanto mais me apaixonava, mais me apercebia de que a minha fé, em ti, era válida, porque tu vivias uma vida irreal, num mundo onde não podias ser tu de verdade, porque te ias perder, segundo tu.

Mas, quando o encanto acabou, eu tive que te olhar com os mesmos olhos de todos os outros.

Continuei a tentar que tu te mostrasses de verdade, porque eu era um lugar seguro, mas nunca o fizeste. Continuaste a brincar numa sala cheia de espelhos, nos quais refletias somente o que os outros queriam, esperavam de ti — e nunca a realidade.

Não a minha, mas a tua.

Como sempre acontece, quando não nos apresentamos de verdade ao outro, acabamos por nunca nos conhecer.

Foi isso que aconteceu e definiu o tom das próximas músicas.

Também eu me escondi nos espelhos que me rodeavam, e, no meio de tudo, tornámo-nos dois estranhos a caminhar lado a lado, mas cada um no seu caminho.

Assim acabámos em caminhos paralelos, sem pontos em comum.

Partimos para novas realidades, onde raramente nos olhámos.

Naquele muito distante dia, chorei, caí no chão com a força total, mas reergui-me. Voltei a acreditar, a sorrir, a rir, a viver.

Ciclos.

Não foi a primeira vez que me aconteceu. Acredito que não será a última.

Mas contigo ficou sempre a vontade de te ver viver.

Gostava de ter noticias. Não tive.

Gostava de saber que eras feliz. Não foste.

Gostava de saber que vivias, mas não soube.

Aquilo que sei é que te perdeste.

Perdeste-te, dentro de ti, pela indefinição de quem eras, e no que te tornaste. Ficaste preso nos espelhos dos outros, e perdeste o teu.

Aquele que reflete quem és de verdade.

Aquele que não queremos encarar. Tu, talvez, mais do que outros, mas esse será o único que importa.

Na verdade, a única busca que precisas de fazer é a de voltares a encarar-te e a ver quem és, voltares a encontrar quem sempre foste — aquele de quem fugias, porque não querias ser aquilo que és —, esquecendo os julgamentos que nada acrescentam, mas que nos transformam naquilo que nos destrói.

Só tu te podes encontrar.

Faz a viagem. Só tu a podes fazer.

Boa viagem de regresso a ti.

Acreditando no karma, e no fado, espero-te do outro lado para um café cheio de sorrisos, de orgulho por teres voltado e, acima de tudo, de felicidade por finalmente te veres da mesma forma que eu te vi, um dia.

Eu acredito em ti.

Fá-lo.

Volta a ser quem estás destinado a ser.

About the Author: Sónia Brandão
Sónia Brandão
Apaixonada por palavras, aprendeu, desde nova, a criar realidades paralelas na sua mente — onde tudo era possível. "Amor de Perdição" foi o primeiro livro que leu. Tinha 13 anos e foi a mãe que lho sugeriu para se ocupar. Desde então, nunca mais parou de ler. Durante alguns anos, no entanto, parou de escrever: sentiu que tinha deixado de fazer sentido. Mas o confinamento fê-la regressar à escrita com mais força e determinação. Este ano, surgiu a vontade de partilhar com os outros o que coloca no papel.

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