Inês Biu Faro

por Inês Biu Faro

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Nunca tive medo de usar a palavra «amo-te». Deve ser das palavras que mais escrevi, escrevo e escreverei. Mas é isso… escrevo. As vezes em que esta palavra foi mais intensa e mais importante foram, provavelmente, as vezes em que menos a disse, ou não a disse de todo e, se calhar, por isso, perdi grandes amores. Calei, muitas vezes, os meus sentimentos. Calei, muitas vezes, as palavras mais importantes. Por medo.

Muito, muito medo — do que pudesse vir do outro, das suas reacções, emoções e até mesmo medo de me expressar e de ser mal interpretada. Medo de usar as palavras que me eram certas para me expressar, ainda que emotivas, por não saber se seria a altura certa para as usar, se seria, sequer, correcto usá-las.

Só há pouco tempo é que comecei a entender que, se eu não falar, ninguém adivinha o que penso e sinto. Não é nas entrelinhas que as palavras se ouvem ou dizem. Se for mal interpretada, pedirei uma oportunidade para me explicar, mas, se me calar, aí é que nunca ninguém me ouvirá.

Também nunca tive medo de dizer e escrever «desculpa». Sou capaz até de a dizer mais vezes do que «amo-te». Não propriamente pela culpa, mas pelo conforto que traz depois de a dizer, pela educação, pela empatia e amabilidade. E, sobretudo, para ficar bem comigo mesma, com a minha consciência.

Sinto que, muitas vezes, as palavras mais bonitas são as menos ditas. As palavras que mais confortam, que falam de coração para coração e abraçam quem as ouve, são as mais silenciadas e trocadas pelas letras que as compõem no papel. Falar, usar a voz, traz sempre um peso diferente às palavras (não é à toa que usamos os sinais de pontuação e, na voz, a entoação, a expressão). Mas quando é que palavras bonitas soaram mal? Quando é que um «amo-te» magoou alguém?

Já, por várias vezes, o disse e não era recíproco. Ainda que me tivesse magoado a falta de reciprocidade, sei que as minhas pessoas amadas se sentiram lisonjeadas com os meus sentimentos. Assim como o oposto: quando não pude ou consegui retribuir da mesma maneira e me senti de coração cheio por ser amada.

As palavras que mais facilmente se repetem e dizem em voz alta são, na sua grande maioria, aquelas que ferem, magoam ou, até, que não têm qualquer significado. Palavras ocas, onde não se sente qualquer sentimento, ditas «porque sim».

E o silêncio mata. Mata mesmo, por não dizermos o que sentimos, por não transmitirmos as aflições, por não pedirmos ajuda ou até mesmo um abraço àquela pessoa que sentimos que vai mudar o nosso dia.

O silêncio da solidão mata por não falarmos, e o cérebro se esquecer de tantas e tantas coisas, se deixarmos de usar as vozes, em vez de as usarmos até que nos doa (metaforicamente!).

As palavras que não disse, nalgumas vezes, ajudaram-me muito a manter a calma e a seriedade, a manter a coragem e a não perder a razão. As palavras que não disse podem não me ter feito perder amores, mas, com certeza, já me fizeram encolher-me perante tal pessoa, dar-lhe todas as prioridades e não dizer o que me deixava desconfortável.

Falar é importante. Não deixar nada por dizer é importante. Aos poucos, os medos perdem-se. É, também, importante lembrar-me (lembrarmo-nos) de que eu sou importante, a minha voz é importante e os meus sentimentos são válidos. Quando gosto, tenho de o dizer; quando não estou bem, tenho de o dizer; quando há algum desconforto, tenho de o dizer; quando quero partilhar uma alegria, mais do que nunca, tenho de o fazer.

As palavras não ditas fazem-nos perder tanto e tantos… fazem-nos perder de nós mesmas e acabamos a navegar no mar do arrependimento: «Porque é que não disse?» Um mar que pode, perfeitamente, começar a ser cada vez mais desconhecido.

As palavras não ditas doem-me mais a mim do que ao outro. Aprendendo a dizê-las, a construir as frases da melhor maneira, a usar o carisma da minha voz, sei que estas dores e medos acabarão por me abandonar. Aprenderei a reconhecer que a reacção do outro é do outro e não minha; que eu fiz o melhor para mim, para eu ficar bem.

As palavras não ditas doem no peito de quem não as deita cá para fora. Já passei muito tempo com dores no peito e pesos na cabeça. Não quero mais.

As palavras não ditas, um dia, sairão todas cá para fora e o meu medo dos espinhos transformar-se-á no jardim florido no meu peito. Tudo porque falei! Disse! Comuniquei!

As palavras não ditas serão, um dia, todas ditas. E não mais as sufocarei.

About the Author: Inês Biu Faro
Inês Biu Faro
Ainda não conhecia o abecedário quando começou a "escrever". Enchia cadernos com linhas "escritas" à sua maneira, com todos os seus contos de fadas e sonhos. Ao longo da escolaridade, aprimorou o gosto pela escrita e desde que se lembra que escreve diários. Não é fácil ser várias mulheres numa única e só os diários a compreendem, por falar consigo mesma. Escreveu, escreve e escreverá sempre com o coração, com emoção, de uma mulher para tantas outras, de um coração para tantos outros. Tem um manuscrito por editar. Será desta que sairá do forno? Esperemos que sim!

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