por Sofia Reis Cardoso

Quando me foi lançado o desafio para escrever sobre este tema [na emootiva], tive, desde logo, uma noção muito clara da ideia que pretendia desenvolver – as consequências das palavras que não dizemos, que guardamos dentro de nós e que o nosso corpo acaba por «gritar», quando atinge um limite.
Como dizia Clarice Lispector: «Perdi muito tempo até aprender que não se guarda as palavras. Ou você as fala, as escreve, ou elas te sufocam.»
A experiência de vida e a maturidade têm-me ensinado que é preciso encontrar um equilíbrio entre reagirmos e dizermos tudo o que sentimos, em determinado momento, e, por outro lado, termos a capacidade de resistir à vontade de soltar tudo o que nos apetece dizer, protegendo-nos ao falarmos apenas na altura certa, mesmo que essa altura tarde em chegar. E foi aqui, quando já estava a escrever, que percebi, claramente, que queria mudar o rumo e o objetivo deste meu texto.
Creio que se encaixa, aqui, na perfeição, o excerto do livro «Hospital dos Alfaces» de Pedro Chagas Freitas, quando refere «Adoro estar calado quanto tentam ofender-me. Há um prazer libertador na quietude. Eles querem sangue, querem reação, querem barulho. Dou-lhes silêncio. Ofender-me exige que eu me importe. Quem sabe quem é não precisa de provar nada a ninguém. Muito menos a quem tenta ferir com pedras que nem arestas têm.»
Com as palavras deste nosso talentoso autor português, identifico-me sobejamente devido a uma situação pessoal que tenho vindo a atravessar, em que tem sido muito desafiante e difícil manter-me, na maioria das vezes, em silêncio, quando sou provocada de todas as formas para reagir e explodir, provocada para criar o tal barulho e sangue de que eu me quero afastar.
Ao partilhar as duas citações destes Autores tão valiosos, que, na minha opinião, são totalmente opostas, apercebi-me de que me identifico claramente com as duas. Na prática, tenho procurado não guardar quaisquer pensamentos ou emoções para mim, porque o passado ensinou-me que esse comportamento me adoece. Faço a minha partilha, sempre que possível, na escrita, mesmo que seja só para mim e nas sessões com a minha psicóloga.
Naquelas situações, como a que me encontro a viver nos últimos meses — em que a vontade primordial é explodir e dizer tudo o que se pensa, sente e vem à cabeça nos momentos em que sou desafiada para tal —, aprendi com a inteligência e maturidade emocional a deixar pairar o silêncio junto do interlocutor. As palavras certas ditas no momento errado podem ser o suficiente para nos tirar toda a razão, que tínhamos até então, e tornar a situação bem mais gravosa e de sofrimento. No momento ideal, as palavras certas serão proferidas, sendo que me vou protegendo das formas que referi anteriormente.
E é sempre disso que se trata – a minha proteção; a proteção da minha ansiedade, do meu equilíbrio emocional, da minha leveza e, acima de tudo, da minha saúde e do meu bem-estar.
Aprendi, nos últimos anos, que dizer um «não» é verdadeiramente libertador – «não quero», «não vou», «não posso», «agora não», sem dar qualquer justificação e não ficar dias ou horas a pensar sobre isso. Ou, por outro lado, como referi aqui, num prompt de escrita deste mês, usar a minha voz para não deixar nada por dizer, nos momentos dito cruciais, seja por vergonha, falta de coragem, hesitação ou outros motivos.
No entanto, há momentos na vida, quando percebemos que estamos a lidar com pessoas com perturbações, com as quais não vamos conseguir ter conversas de «igual para igual», em que, por vezes, o melhor é deixar essas mesmas pessoas a falar sozinhas. Deixá-las criarem a guerra e lutarem sozinhas dentro delas, já que é de estar em conflito que tanto precisam e, assim, protegermo-nos o mais possível, sem que com isso estejamos a «engolir» palavras e a adoecer-nos por dentro.