Sónia Brandão

por Sónia Brandão

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O vazio que me preenche é demasiado para continuar, é demasiado para conseguir continuar a respirar…

Lembro-me do primeiro olhar. Lembro-me do primeiro sorriso. Lembro-me do primeiro toque. Lembro-me do primeiro beijo. Lembro-me de tudo.

Lembro-me das primeiras palavras. Lembro-me das primeiras lágrimas.

Lembro-me dos teus olhos. Recordo o teu rosto. Volto a ti.

Lembro-me da primeira volta…

Somos adultos, como dizes. Somos responsáveis pelas nossas decisões. Somos os únicos com o poder de criar e destruir a nossa realidade, a nossa felicidade, mas nem sempre a vida acredita nesses requisitos que usamos para justificar o tudo e o nada.

No meio de todas as tempestades que a vida nos deu, sempre estivemos juntos, sempre lutámos lado a lado para nos mantermos na vida um do outro, sempre fomos a força escondida e necessária para enfrentar tudo.

Quando o mundo decidiu que nós não estávamos bem juntos, nós lutámos, nós acreditámos que era o certo para nós, e enfrentámos tudo — família, amigos, tudo — e criámos a nossa própria família de amigos e de sangue.

Criámos a mais bela das realidades, cheia de bons e maus momentos, porque também fazem parte da vida.

Nunca desistimos. Não de nós!

Mas hoje eu quero desistir.

Os nossos primeiros momentos juntos foram de pouca pele, e de muita mente. Nenhum de nós estava preparado para o que se iria seguir e tivemos medo. Medo do incerto. Medo do que o outro nos podia tirar.

Perdemos tempo e mais tempo a fingir ser o que não éramos, a fingir que nenhum dos dois se encontrava perdido sem o outro, e saímos, desistimos de nós.

Voltámos.

Voltámos porque a vida não contempla quem desiste, não espera por quem tem medo. E, um dia, ficámos frente a frente e percebemos que nada fazia sentido, que tudo o que estávamos a fazer era sobreviver, sem perceber que o que queríamos e precisávamos era de viver.

Decidimos juntos, sem medo um do outro, com a certeza do que iríamos acrescentar, sem pensar no que poderíamos perder no caminho. Fazer o resto do nosso caminho na vida juntos: porque queríamos ambos viver.

E como vivemos!

Depois desse encontro, depois da perda, criámos, vivemos tudo o que era importante, sentimos tudo o que deveríamos, vivemos com o julgamento de todos — daqueles que nunca tiveram coragem de lutar pelo que importa na vida, que se limitaram a viver aquilo que apareceu, que nunca se atreveram a ser felizes.

Houve momentos em que te amei mais do que tudo, mais do que a mim. Tu retribuíste da mesma forma. Amaste-me mais do que a ti. Pior: deixaste de te amar para me amar a mim.

O amor salva, mas também destrói, quando nos esquecemos de nós. O nosso amor salvou-nos muitas vezes, mas hoje destruiu aquilo que eu amava.

Mas a vida foi demasiado curta.

O vazio que me preenche é demasiado para continuar, é demasiado para conseguir continuar respirar…

A existência é feita de perdas, mas não devia ser feita de momentos destes, em que a cobardia e a coragem se juntam no pior dos momentos.

Não sei por onde ir. Não sei como continuar. Não sei como caminhar. Não sei continuar.

Decidiste ir, partir… E eu morri contigo porque deixei de respirar.

About the Author: Sónia Brandão
Sónia Brandão
Apaixonada por palavras, aprendeu, desde nova, a criar realidades paralelas na sua mente — onde tudo era possível. "Amor de Perdição" foi o primeiro livro que leu. Tinha 13 anos e foi a mãe que lho sugeriu para se ocupar. Desde então, nunca mais parou de ler. Durante alguns anos, no entanto, parou de escrever: sentiu que tinha deixado de fazer sentido. Mas o confinamento fê-la regressar à escrita com mais força e determinação. Este ano, surgiu a vontade de partilhar com os outros o que coloca no papel.

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