Sofia Reis Cardoso

por Sofia Reis Cardoso

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Atingi a fase da rigidez emocional. Estou a aprender a doseá-la. Não me identifico muito com ela, mas tem estado cada vez mais presente nas minhas atitudes e eu consigo identificá-la. Ao dia de hoje, já a identifico sozinha, mas o primeiro alerta veio numa sessão com a minha psicóloga, há meia dúzia de semanas atrás.

Naquela altura, estava num lugar muito escuro, pequeno, apertado e solitário. A primeira conversa foi num domingo de manhã, durou quase duas horas e foi, no fundo, a nossa apresentação. Semanalmente, passou a ser o nosso encontro por 50 minutos e assim foi durante muito tempo, tendo passado por situações limite, em que foi necessário antecipar e ter duas sessões na mesma semana. O objetivo inicial era simplesmente sair da cama e encontrar uma atividade que desse algum movimento e sentido aos meus dias. A mente estava bloqueada, mas o corpo também não estava muito melhor. Aos poucos, a fisioterapia começou a fazer efeito, depois a hidroginástica, mais tarde o pilates, até que a cabeça começou a acompanhar.

As conversas já faziam mais sentido, as ideias já se começavam a organizar e pequenas tarefas iam sendo definidas ao longo dos dias, até que foi possível pôr a hipótese de começar a trabalhar. A eterna questão: se algum dia iria conseguir voltar a trabalhar! Foi algo que me atormentou desde o início, desde que eu tomei consciência das minhas limitações.

Estamos a falar de um processo muito longo, com subida de muitos degraus, mas em que, muitas vezes, também desci alguns, para conseguir voltar a subir. O meu processo de terapia começou na sequência da minha recuperação de uma complicação de saúde física, mas que, cada vez mais, pela própria ciência, se vê reconhecida como uma doença muito associada às emoções.

As minhas sessões de terapia são o cuidado número um da minha saúde emocional. Quando a minha saúde emocional não está bem, todo o meu corpo se ressente e eu já aprendi a estar alerta para esses sinais e a perceber como, tantas vezes, as minhas manifestações físicas são reflexo das minhas dores emocionais.

Ao longo destas sessões, passei a conhecer-me como nunca me tinha conhecido e a perceber o impacto que as atitudes das outras pessoas tinham em mim, tal como as minhas atitudes, ou a ausência delas, tinham na minha relação com as outras pessoas.

Neste caminho, tenho aprendido a resignificar conceitos como culpa, responsabilidade, posicionamento, consciência, justiça, limites, entre outros, que mudaram radicalmente — para melhor — a minha relação comigo e com as pessoas que me rodeiam. Consigo fazê-lo porque a relação que criei com a minha terapeuta é muito especial e é, acima de tudo, uma relação de amor e verdade. Tenho a perfeita noção de que esta é uma conexão única, que eu tive muita sorte de conseguir encontrar e criar, mas que me tem dado todas as bases para este meu desenvolvimento.

Da mesma forma que o meu corpo precisou de ser trabalhado, aos poucos, com a fisioterapia, a hidroginástica, o pilates e, mais recentemente, os treinos de força, também a minha mente e as minhas emoções precisaram de ser estimuladas. Na verdade, já precisavam há muitos anos, mas foi preciso um evento — dito catastrófico — na minha vida, para gerar o início do cuidado mais mágico e completo que eu alguma vez tinha tido comigo própria.

Aprender a lidar com as minhas emoções foi o ponto de partida para viver com menos stress, menos ansiedade; para ter ganho mais confiança em mim, ter aprendido a gostar de mim, em primeiro lugar, a descobrir coisas de que gostava e a pô-las em prática, sem me preocupar com a opinião alheia. É preciso trabalhar estes pontos todos os dias para sentir que as minhas emoções estão saudáveis, senão, rapidamente, surgem as dores de cabeça, as dores de corpo e a vontade de ficar na cama, o não querer estar ou falar com pessoas, entre outros sintomas mais ou menos fáceis de decifrar. É preciso estar saudável emocionalmente.  Não só para estar feliz, mas também para prevenir o desenvolvimento de doenças.

Passaram-se muitas sessões em que não tive qualquer evolução — ou, pelo menos, eu não a reconhecia — e a minha terapeuta dizia-me que não havia problema. No entanto, quanto mais tempo eu demorasse a começar o caminho, mais tempo eu ia demorar a chegar ao destino. Mas a verdade é que só dependia de mim e só eu podia iniciá-lo. E assim foi.

Indo buscar uma parte do primeiro texto que aqui publiquei, esse caminho iniciou-se no dia em que eu deixei de atribuir culpas a terceiros e reconheci a minha responsabilidade em todas as equações de que eu fazia parte. Dito por outras palavras, deixei de interpretar «o papel da vítima», aquele que é mais confortável, pois permite-nos continuar a agir da mesma forma, à espera de que os problemas se resolvam sozinhos e que as outras pessoas mudem os seus comportamentos.

Mas, aqui, permitam-me a vaidade, tenho muito orgulho de mim própria. Porque é nesta fase, neste ponto de viragem, que é preciso ter uma força muito maior do que tudo para conseguir vencer. Ultrapassando este ponto, eu acredito que tudo o que se segue vai-se tornando mais fácil, mas é aqui que está o sacrifício, a escolha, a responsabilidade, acima de tudo, a mudança.

E esta mudança tem muito impacto não só na própria pessoa, como em todas as que a rodeiam e, claro, eu notei que isso aconteceu comigo — e a reação nem sempre é a mais positiva. Em primeiro lugar, é muito difícil, desde logo, para as pessoas — muitas vezes, para aquelas que estão mais próximas de nós — aceitarem que a nossa mudança não acontece de um dia para o outro. Da mesma forma que foi necessário reaprender a andar, a comer sozinha, a tomar banho, a vestir, a pentear — todas estas tarefas sem o auxílio de ninguém —, também para sair daquele casulo foi preciso tempo, e cada pessoa tem o seu. Fazer comparações e tentar acelerar o processo não ajuda. A borboleta também precisa de concluir o seu processo de sair do casulo sozinha, de forma natural, sem ser apressada, para poder voar de forma saudável.

Eu sinto que isso nem sempre aconteceu comigo, quando, por gostarem de mim, desejavam muito a minha recuperação e não compreendiam o quanto eu ainda não conseguia sair daquele estado. Ao longo deste caminho, percebi quando, muitas vezes, fui injusta com pessoas mais ou menos próximas e, tantas outras vezes, as pessoas foram injustas comigo. Aprendi a lidar com essas injustiças, a proteger-me delas e, acima de tudo, a não permitir que elas modifiquem o meu emocional.

Mas tornei-me, de tal forma, protetora da minha saúde mental e das minhas emoções que criei alguma rigidez emocional. É preciso muito cuidado para não deixar esta rigidez avançar para egoísmo ou ausência de empatia para com os outros.

Vou continuar sempre a cuidar e a trabalhar das minhas emoções — agora, com muito foco no doseamento da minha rigidez. Que nunca nos esqueçamos do quanto a nossa saúde emocional é importante!

About the Author: Sofia Reis Cardoso
Sofia Reis Cardoso
Escrever, ler e dançar são as suas formas preferidas de passar o tempo. Estudou Direito, trabalha no Departamento de Contencioso de uma Seguradora, mas é nas letras e no papel que encontra o seu refúgio e a sua maior concretização. Natural de Tomar, entregou o seu coração a Lisboa aos 18 anos e é com a capital que mais se identifica. A Emootiva é uma extensão daquilo que a apaixona e onde quer continuar os seus passos, juntamente com outras escritoras.

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