por Inês Biu Faro

Quanto mais penso nas palavras que intitulam este texto, mais fundo mergulho no meu próprio corpo; no quanto fico mexida e remexida uma vez por mês; em como, ao longo dos últimos 23 anos, aprendi a lidar com uma natureza que não escolhi ter. Uma natureza que, para muitas mulheres, é tão importante ter – para gerar os filhos –; para tantas outras, é tão difícil – por não existir e dificultar a fertilidade – e, ainda, para poucas traz poucas ou nenhumas alterações a não ser a do sangramento.
Sabendo de antemão a mulher emotiva que sou, é de se esperar que fique ainda mais emotiva nestas semanas. E fico mesmo. Choro por tudo e por nada, fico irritada por coisas que não fazem qualquer sentido e tanto quero ficar sozinha no meu canto, como quero todo o colo do mundo.
«Já tens o período! Parabéns! És uma mulher» é tudo o que menos esperamos ouvir aos 13 anos. Eu, pelo menos, não esperava, mas já sabia o que era. Os meus pais tinham-me explicado. Só não me tinham falado sobre todas as pressões sociais de ser mulher, quando ainda nem era adolescente, e já haver a possibilidade de procriar. No fundo, eu só queria que tivesse vindo mais tarde. Foi uma altura muito estranha. Tinha mudado de escola, de turma e de amigos meses antes. Foram mudanças muito abruptas em pouco tempo! Mais esta mudança interna… imagine-se como estaria a mente desta menina. Fui-me adaptando como podia, percebendo e compreendendo melhor o meu corpo. Percebi que ficar quieta piorava as dores e não faltava às aulas de Educação Física. Descobri que medicamentos fariam efeito mais rápido e ainda comecei a anotar todas as mudanças e os dias de sangramento. Entrou, na minha vida, uma nova rotina que eu teria de decidir se teria para sempre, ou se iria apenas deixar acontecer e dar conta se acontecesse alguma coisa de diferente.
E aconteceu. Os primeiros cinco anos foram muito dolorosos e acabei por ficar anémica. Resolveu-se, claro. E adaptei a nova rotina enquanto via, também, o meu corpo a adaptar-se — o peito a crescer, a cintura a estreitar, as pernas e o rabo a arredondarem. Todo o meu corpo se adaptou a mais uma fase de crescimento. Eu adaptei-me ao corpo que tinha, ainda que cheia de inseguranças. Fui tentando encarar tudo o melhor que podia.
Lidar com o meu corpo tem sido o maior desafio da minha vida. Ora adoro, ora detesto. Oscilo no peso e nem sempre gosto de me olhar ao espelho. Até mesmo ter de lidar com as vozes femininas que me rodeiam e tanto criticavam – e criticam! – as minhas formas, e decidir ouvi-las ou ignorá-las, situação que nem sempre é fácil, mas da qual acabo por me conseguir desligar. Comecei a valorizar, cada vez mais, os dias em que me olho ao espelho e me sinto a mulher mais sexy do mundo!
Lembram-se de quando vos contei que era uma exímia criadora e utilizadora de máscaras? Foi quando comecei a criá-las e a envergá-las que os meus medos começaram a ter mais voz do que a minha força – quero acreditar que é algo comum na adolescência. Nem todas as minhas colegas de turma tinham o período. As que já tinham sentiam-se muito crescidas e eu não queria ser crescida, não queria sentir tantas mudanças de uma só vez. Eu só queria hibernar e deixar de sentir tantas dores. Não queria sequer o acne ou ouvir «não comas isso que ficas com mais borbulhas», ou «usa este creme que é bom!», ou ainda «porque é que não tomas isto ou usas aquilo?» Ouvia todas as vozes que me rodeavam e mal me conseguia ouvir a mim. Queria calma e sossego. Queria conhecer-me e não me davam espaço.
Quando me senti com força, bati com o pé. O corpo é meu, o período é meu e as regras também! Só eu sei como me sinto em cada mês.
Fisicamente, é horrível por causa das enxaquecas e das dores nas pernas.
Emocionalmente… por onde hei-de eu começar?
Emocionalmente, é o turbilhão que já referi, de choradeiras, de distâncias e colos. De tentar perceber se me sinto realmente assim ou se será apenas uma resposta às hormonas. E, mais do que sensível fisicamente, fico emocionalmente sensível e é quando me conheço melhor, quando faço por ser uma mulher melhor, quando perco mais um pouco do medo que tenho em falar, em dizer o que não gosto e o que não quero. Onde digo sem pudores: «Desculpa. Foi o período a falar. Não eu. Errei!» E é quando mais preciso de dizer o quanto me amo, o quanto o meu corpo é bom e descarrega o que não lhe faz falta. E que posso – e devo – ser grata por ter saúde e um corpo que responde a estímulos.
Precisamente por ser um turbilhão emocional, há momentos em que nem sequer me reconheço, em que não sei quem sou e em que as dores físicas me roubam a energia até à alma, mantendo a esperança de a recuperar num duche quente e demorado. Há meses em que perco a inspiração para escrever e choro, choro mesmo muito, em silêncio, para as minhas almofadas. De alguma maneira, as emoções têm de ser respeitadas e libertadas – algo que aprendi um pouco tarde, mas sempre a tempo.
Assim como não escolhi sofrer fisicamente com as dores – sejam elas mais fortes ou mais moderadas –, também não escolhi sofrer com a confusão psicológica, mas tenho aprendido a resolver o melhor que posso, a encontrar maneiras de reestruturar a minha criatividade e a não sucumbir às dores e confusões. A única coisa que peço é que não me confundam ainda mais. Pelo contrário, se eu pedir ajuda, deem-me a mão, deem-me colo ou espaço. Eu pedirei. Eu aceitarei.
Nem sempre é fácil ser Inês. Nem sempre é fácil ser Mulher. Mas não é impossível.
Respeitem como eu respeito o meu corpo, o meu período e as minhas regras!