por Sofia Pereira

Olho para mim.
Não com os olhos duros que o mundo, tantas vezes, me ensinou a usar, mas com os olhos de quem conhece a própria história — sem filtros, sem julgamentos.
Olho-me e sorrio — porque sei.
Sei o que carrego, para além da pele e dos olhos dos outros.
Já pesei mais de oitenta quilos num corpo pequeno, de palmo e meio de altura.
E era feliz.
Comia com gosto, com prazer.
A minha mãe conta que, ainda menina, não suportava ver um prato vazio: terminava a refeição e, com um gesto decidido, atirava o prato ao chão — como quem diz: «Quero mais vida. Quero mais amor.»
E foi assim, a amar sem medo, que cresci.
Com o tempo, as adversidades da vida chegaram sem aviso.
Trouxeram consigo dores silenciosas, ausências, feridas invisíveis que, pouco a pouco, foram moldando não só a minha alma, mas também o meu corpo.
Sem pressa, e sem que eu percebesse, emagreci até ser quase vento — quarenta e quatro quilos de fragilidade e resistência.
Hoje, carrego um pouco mais de cinquenta.
E sinto, finalmente, que voltei a habitar-me.
Não como quem ocupa um lugar por obrigação, mas como quem regressa a casa depois de uma longa viagem.
Quando cada curva do meu corpo pulsava alegria e autoaceitação, ouvi murmúrios e palavras pequenas — tentativas de diminuir uma alegria que nunca coube em olhos mesquinhos.
Mas não baixei a cabeça. Nunca.
O meu corpo era cheio de mim — de riso, de verdade, de luz. Era casa. E era meu.
Quando emagreci, as vozes tornaram-se mais frias.
Senti-as ferirem no silêncio dos olhares, nas palavras fingidamente gentis, nas perguntas que escondiam julgamento.
Olharam-me como quem vê uma tragédia silenciosa.
E julgaram-me, como se soubessem mais da minha história do que eu própria.
As pessoas são cruéis.
Carregam nas mãos pedras invisíveis e lançam juízos como quem respira — sem pensar, sem pesar, sem remorso.
Julgam o que não entendem. Comentam o que não é seu.
Mas eu aprendi — aprendi a olhar para mim além dos números, além das medidas, além da carne e do osso.
A minha essência não se pesa.
A minha beleza não cabe em balanças, nem em moldes de ninguém.
Quem quiser amar-me terá de aprender a ver com outros olhos.
Olhos que vejam para além do que é visível, para além do corpo.
Olhos atentos à alma, onde arde, discreta, mas firme, a força que nunca se deixou vencer.
Porque o que sou, o que verdadeiramente sou, nenhuma balança poderá medir.
E nenhum olhar alheio conseguirá apagar.
Parabéns! Adorei !