por Sónia Brandão
Olhar para a vida dos outros e opinar é sempre mais fácil do que vivê-la.
Há uns anos, quase noutra vida, as relações eram mais intensas. Por vezes, parecia que as decisões daquele momento iam alterar tudo para sempre.
Os amores eram intensos.
Eram mais reais, mas com o passar dos anos as rotinas instalam-se e nem sempre se diz o que tem que ser dito. Por vezes, só se segue com a esperança de que o mundo continue a ser perfeito dentro da imperfeição da vida.
Aquela relação, entre duas pessoas que claramente gostavam uma da outra, foi-se perdendo. A cumplicidade desapareceu. A frieza surgiu. Por vezes, percebia-se a indiferença mesmo que muito disfarçada.
Apareceu uma oportunidade de sair da rotina, por umas semanas, e ela aproveitou. Precisava de sair da vida. Precisava viver — algo que tinha deixado de fazer.
Foi para outro sítio, longe dele, na esperança de que as coisas mudassem, mas, acima de tudo, com a mente aberta para tudo aquilo que podia acontecer. Sem prisões mentais, emocionais. A relação continuou, mas a distância fez a diferença.
Como em outros momentos no passado, sendo ela quem é, conheceu pessoas, criou laços, criou cumplicidades que a outros parecem impossíveis de existir.
Inevitavelmente, conheceu um homem, que lhe despertou interesse, que a foi conquistando, com tudo o que faltava na sua relação — momentos de cumplicidade, de compreensão, de liberdade, onde podia ser quem é, onde podia existir sem cobrança, onde podia ter uma voz.
Envolveram-se, emocional e fisicamente. Ela renasceu, aprendeu a rir, a sorrir, a ser ela como já não se lembrava de ser. Escondeu tudo como pode, mas sem nunca ter intenção de o fazer. Aqueles momentos eram só dela e do homem que a trouxe, de novo, à vida.
Mas existia alguém que ainda a esperava, pacientemente.
Ele sabia. Sempre soube, no seu íntimo, o que estava a acontecer, mas esperou. Esperou até ser o momento.
Passaram-se algumas semanas até que a realidade a atingiu com toda a força. Não houve sinais. Simplesmente, acordou, um dia, e olhou para tudo o que se passava. E decidiu lutar pela relação que parecia estar a morrer.
Aquele breve caso, que a mudou, que a transformou noutra pessoa, demonstrou-lhe o que queria.
Queria o passado com o homem que amava.
Voltou para casa. Sentaram-se, um em frente ao outro, e falaram. Disseram tudo o que esconderam durante meses. Foram honestos.
Ele teve a certeza da existência de outra pessoa. Ela soube o quanto o magoou. Choraram, sofreram, e separam-se. Acharam que era o momento de terminar. Apesar de se amarem, não tinham forma de se olharem e de continuar.
Deram tempo um ao outro. Deixaram a vida curar aquilo que eles destruíram, mas estiveram sempre presentes na vida um do outro.
Não desistiram. Lutaram para reconstruir aquilo que foi destruído por indiferença.
Semanas depois, voltaram. Protegeram a sua relação de todos e de tudo. Viveram um com o outro, isolaram-se, e falaram. Disseram tudo o que precisava ser dito. Os defeitos. O mau. O bom. Aquilo por que deviam lutar.
O que para muitos era definitivo, para eles foi o início de algo sólido, de algo único, que perdura ao longo dos anos.
Cresceram juntos. Criaram uma vida. Aprenderam a tolerar o outro, com defeitos e qualidades. Criaram uma família única.
Acima de tudo, hoje, continuam a amar-se e a demonstrar esse amor, onde quer que estejam.
Por vezes, algo que pode ser mau é somente aquilo de que precisamos para continuar, para lutar, para falar.
Se não tivesse existido essa terceira pessoa…